O Rio de Janeiro foi a primeira cidade brasileira a receber imigrantes chineses, ainda no século XIX. Entre 1812 e 1819, cerca de 300 deles foram trazidos de Macau pelo Governo Real Português, a fim de iniciar o plantio de chá, que não foi bem-sucedido. Durante sua primeira viagem ao Brasil, entre 1821 e 1825, o pintor alemão Johann Moritz Rugendas registrou a plantação chinesa de chá no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, numa gravura que publicou no livro Viagem Pitoresca Através do Brasil.
Insatisfeitos com o rigor da servidão a que eram submetidos, parte deles fugiu e passou a trabalhar como vendedores ambulantes ou cozinheiros, enquanto outra parte seguiu para nova tentativa de cultivo do chá, na Fazenda Real de Santa Cruz. Segundo Shu Chang-Sheng, doutor em História pela UFF, em 1825 vários chineses registrados com nomes brasileiros conseguiram licença para trabalhar como mascates, vendendo peixes e pastéis pelas ruas da cidade. Alguns prosperaram, abrindo restaurantes, mercearias e lavanderias, em especial na região do bairro da Tijuca, onde se fixaram.
A partir de 1856, o Jardim Botânico passou a ser ligado ao Alto da Boa Vista, por uma estrada que foi aberta por mão de obra chinesa. Em homenagem a esses trabalhadores, o prefeito Francisco Pereira Passos mandou construir, em 1903, um mirante, que oferece a melhor vista dos principais cartões postais da cidade. É a Vista Chinesa, dentro do Parque Nacional da Tijuca, na Estrada da Vista Chinesa, e considerada o maior monumento dedicado a um país asiático em toda a América Latina. Localizada a 380 metros de altitude, permite uma visão panorâmica que abarca o Cristo Redentor, a Lagoa Rodrigo de Freitas, o Pão de Açúcar, o Morro Dois Irmãos e as praias da Zona Sul do Rio de Janeiro.
O mirante, em concreto, reproduz um pagode chinês erguido com troncos de bambu. Em cada uma das quinas dos dois telhados sobrepostos está situada uma gárgula com cabeça de dragão. Restaurado pela primeira vez em 2013, o ponto turístico é um dos que mais atraem visitantes interessados em apreciar a exuberância natural da cidade. Na mesma ocasião, a Estrada da Vista Chinesa também passou por obras de recapeamento.
Contribuição chinesa para o comércio e para a gastronomia
Se, no início, a maioria dos imigrantes chineses era cantonesa (oriunda da região Sul do país), a partir da Revolução Republicana na China, em 1911, começaram a chegar também os imigrantes vindos da cidade de Qingtian, na província de Zhejiang, que se dedicaram ao comércio dos produtos importados. Com o tempo, esses ambulantes se estabeleceram em bazares. Na Rua do Ouvidor, no centro do Rio, dois amigos abriram uma loja para vender toalhas bordadas. O negócio deu tão certo que logo eles passaram a comercializar, também, artigos de porcelana, lenços de seda e artesanato em geral.
De acordo com o historiador Shu Chang-Sheng, em 1925 outros três chineses abriram um restaurante-pensão na Rua Barão de Mesquita, na Tijuca. Em 1932, surgiram mais um restaurante na Rua México, 44 e outro na Praça da República. Em 1926, Wang Yi-Tsong veio para o Rio, depois de 11 anos morando em Porto Alegre, onde chegou via Argentina. Foi só em 1937, depois de muito trabalho duro, que ele abriu o restaurante Camões, na Praça Tiradentes, 47, logo reconhecido como um dos mais populares do centro da cidade.
Em 4 de outubro de 1919, cerca de cem imigrantes se reuniram para fundar o Centro Social Chinês do Brasil, que existe até hoje, situado na Rua Gomes Freire, 753, no Centro, e que é fortemente ligado ao governo de Taiwan. Além dele, existe a Associação Chinesa do Rio de Janeiro, fundada em 1984, que fica na Rua Gonçalves Crespo, 450, na Tijuca, e reúne os que se originam da China continental – em especial os que frequentam o restaurante Hua Lian, que abre diariamente, em horário comercial. É costume da comunidade, ainda hoje, comemorar as datas festivas do calendário chinês, como o Ano Novo ou o Festival de Outono.
A revolução de Mao Tsé-Tung, que implantou o regime comunista na China em 1949, levou à suspensão das relações diplomáticas com o Brasil até 1974. A partir dos anos 1990, uma nova leva de imigrantes originários de Qingtian se fixou na região conhecida como Saara (Sociedade de Amigos das Adjacências da Rua da Alfândega), de comércio tipicamente popular, que cobre 11 quarteirões no centro do Rio de Janeiro. A Saara tem aproximadamente 1.250 lojas. Segundo o presidente da sociedade, Ênio Bittencourt, cerca de 10% delas pertencem, atualmente, a imigrantes da China.
Aproximação cultural sino-brasileira
O tai chi chuan de grupos reunidos nas principais praças do Rio já não surpreende mais ninguém: há anos, esta arte marcial chinesa foi incorporada ao dia a dia do carioca. Assim como a massagem do-in e a acupuntura, decretada patrimônio cultural intangível da humanidade pela Unesco, em 2010. E quando o assunto é alimentação, convém lembrar o yakisoba, o rolinho primavera, o chop suey e o frango xadrez, que já fazem parte da mesa do brasileiro. Há, inclusive, quem atribua aos chineses o mérito da criação da receita do macarrão, que teria sido trazido para o Ocidente por obra do navegador Marco Polo, no século XIII. Na cultura chinesa, não existem porções individuais. “Os principais eventos cotidianos dos chineses são realizados ao redor da mesa, compartilhando refeições com amigos, familiares ou parceiros de negócios”, explica Willian Moreira, gerente-geral do Centro Cultural China-Brasil (CCCB), que há dez anos funciona no centro do Rio, Barra da Tijuca e Copacabana.
A principal atividade do CCCB é ensinar mandarim para brasileiros, mas também ensinar o português do Brasil para chineses, nas filiais em Pequim e Xangai. “Oferecemos aos nossos alunos diversas atividades culturais, para ampliar e aperfeiçoar o aprendizado do idioma chinês. Como, por exemplo, aulas no restaurante chinês, para que os alunos conheçam os costumes do país durante as refeições, aulas de história da China, aulas de caligrafia e história dos ideogramas, karaokê com músicas chinesas e possibilidade de intercâmbio em nossas filiais na China“, explica Willian, lembrando que a presidente do curso, professora Yuan Aiping, foi quem desenvolveu o método e os livros usados.
Antigamente, eram sobretudo os empresários que se interessavam em aprender mandarim. “Com o destaque mundial da China e o grande investimento chinês no Brasil, muitos pais estão incentivando seus filhos a aprender mandarim como um diferencial para o concorrido mercado de trabalho”, explica o gerente-geral do CCCB. “Nós desenvolvemos um material multimídia para crianças, para atender essa demanda. Hoje, a maioria dos nossos alunos é formada por jovens de 16 a 35 anos, e já temos muitas crianças estudando conosco.”
Incentivos do consulado da China buscam várias maneiras de integrar os cidadãos chineses à cultura carioca. A estimativa é de que haja um número superior a 10 mil chineses vivendo atualmente no Rio de Janeiro. “O carioca é muito alegre e espontâneo, e os chineses adoram essa alegria demonstrada nas ruas, no samba, no futebol. Quando chegam ao Rio, eles se apaixonam pela cidade.”
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