Vivemos imersos em um mundo de múltiplas mídias e linguagens que afetam nossas relações cotidianas e nossos modos de ser, mas não costumamos nos dar conta do quanto elas impactam nossas percepções, sociabilidades, formas de trabalhar, interagir, comprar e, até mesmo, fazer política e exercer a cidadania. Só para citar um exemplo do tanto que os meios de comunicação nos afetam, hoje conseguimos falar com alguém que mora no interior da China em frações de segundo, enquanto nossos avós precisavam de semanas, talvez meses, para fazer com que sua mensagem lá chegasse. Obviamente, isso altera de forma profunda nossas interações e percepções de tempo e espaço.
A sala de aula não está apartada dessas alterações. As mídias, com suas linguagens e tecnologias, têm imposto constantes desafios à área educacional. É fato que as práticas pedagógicas sempre precisaram se adequar às transformações históricas e culturais, mas, hoje, como costuma lembrar o professor Júlio Furtado em suas palestras sobre Metodologias Ativas, a produção de informação se acelerou em velocidade vertiginosa, requerendo dos docentes atualizações contínuas. Segundo ele, na década de 1950, seriam necessários 200 anos para a humanidade dobrar a quantidade de conhecimento produzido até aquela data. Em 2020, esse intento já era possível em menos de 2 anos.
Nesse contexto, o campo da midiaeducação se consolida como uma abordagem importante e necessária para, entre outros aspectos, alinhar o dia a dia da sala de aula com a cultura midiática contemporânea. Mas do que estamos falando?
Segundo o professor inglês David Buckingham, importante pesquisador da área, as pessoas costumam achar que ensinar midiaeducação é usar a televisão ou o computador para explicar um assunto específico. Mas, segundo ele, midiaeducação significa ensinar pessoas a entenderem as mídias e terem senso crítico sobre elas. “É muito mais relevante ensinar a respeito das mídias do que através das mídias”, diz, em vídeo disponível no canal do Grupo de Pesquisa em Educação e Multimídia (Grupem) da PUC-Rio.
Mídias e docências
Construir novas culturas pedagógicas não é um processo simples. Uma visão bastante recorrente para enfrentar as questões atuais tem sido aquela que coloca o uso das tecnologias como a solução dos problemas enfrentados. Mas a simples substituição de suportes não tem se mostrado suficiente para promover mudanças mais profundas na escola.
No livro Inclusão digital e educação: a nova cultura da sala de aula, Magda Pischetola, professora na área de mídias e tecnologias do Programa de Pós-Graduação em Educação da PUC-Rio, indaga-se sobre a perspectiva que a Educação deveria adotar para dialogar com o contexto e as relações que os estudantes estabelecem com as mídias. Ela concorda com David Buckingham na ideia de que, para se construir uma visão crítica, é preciso, antes de tudo, refletir sobre a maneira como acessamos e interagimos com as mídias. O investimento emocional que fazemos ao usá-las é outro ponto fundamental a se considerar.
Essa reflexão inclui, ainda, verificar as diversas práticas com as quais nos deparamos nas relações que estabelecemos com as mídias: suas linguagens, os conteúdos veiculados, a maneira como a informação é apresentada e incorporada por quem lê... Para o professor inglês, essa reflexão faz parte da criação de uma consciência mais ampla sobre como a mídia está relacionada aos processos sociais, culturais, políticos e históricos.
Magda Pischetola ainda pontua que, ao pensar sobre tais questões, o professor também compreende os próprios limites, ajudando-o a identificar suas necessidades de formação neste campo.
De consumidores a produtores
Entender a cultura midiática na qual a sala de aula está imersa implica em escuta. Antes de tudo, é fundamental identificar as práticas cotidianas dos estudantes e as relações que eles estabelecem com os diferentes meios: o que utilizam para se informar, como se comunicam, como se divertem etc. Só então é possível analisar as mensagens que os afetam: de que modo foram produzidas, com qual intencionalidade, qual tipo de linguagem e de discurso utilizado...
Também é primordial entender (e debater) como a informação foi apropriada pelo coletivo e por cada um. Ao destrinchar com os alunos as várias dimensões do que é veiculado nas mídias, fica mais fácil explorar seus dispositivos e recursos com o intuito de que os alunos também produzam suas próprias narrativas. Essa produção pode (e deve) inclusive suscitar práticas colaborativas.
A criação conjunta amplia possibilidades e profundidades. E mais: os processos de produção de mídias na escola favorecem o trabalho coletivo e colaborativo, além de propiciar o desenvolvimento de múltiplas habilidades, em diálogo com os diferentes campos de conhecimento.
Também não se pode tirar da mente que a midiaeducação dialoga com as 10 competências gerais definidas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), em especial, e de forma muito estreita, com quatro delas: a criação do pensamento crítico e criativo; o domínio da comunicação; a compreensão da cultura digital; e a capacidade de argumentação.
Sua ideia é promover o reconhecimento e a valorização do trabalho realizado pelos profissionais de Educação da Rede e contribuir com a ampliação e divulgação de suas práticas docentes. Visa ainda fomentar o acompanhamento, o intercâmbio e a colaboração entre professores, coordenadores pedagógicos e gestores escolares.
Até o final de março, o Cartografia de Boas Práticas deve publicar, aqui no Portal MultiRio, uma série de editais voltados às diferentes áreas de atuação pedagógica. A midiaeducação será contemplada! Fique atento!